Em Junho de 1974 começaram a chegar pessoas a Lisboa vindas dos territórios africanos, nomeadamente da Guiné e de Moçambique. A palavra “retornado” ainda não entrara no léxico quotidiano nacional. Eram designados de “refugiados”, “deslocados” ou “desalojados”. No entanto, apesar de o seu número ser ainda reduzido, foi fácil percecionar que, em breve, ele se elevaria. Soava o sinal de alarme! Por isso, foi criado no então Ministério da Coordenação Interterritorial um Grupo de Apoio aos Desalojados do Ultramar (GADU), o qual prestou auxílios de emergência. Este Grupo desenvolveu atividades múltiplas, e cada vez mais exigentes, perante o crescente afluxo de pessoas e famílias. Esse afluxo mostrou-se muito grave logo no início de 1975 e o GADU não encontrou respostas necessárias nas diversas estruturas da Administração Pública, as quais resolveram ignorar o problema. Foi preciso criar um serviço nacional que desse respostas. Neste contexto, foi criado o Instituto de Apoio ao Retorno de Nacionais.
O IARN foi o mais importante e conhecido organismo público envolvido no apoio aos portugueses que, na sequência da descolonização, abandonaram Angola, Moçambique e outras ex-colónias (os chamados retornados). Com sede em Lisboa, e delegações em Faro, Funchal, Porto, Vila Real e Viseu, assumiu responsabilidades em todas as áreas, funcionando como se existisse nele uma administração pública destinada apenas às pessoas que regressavam das colónias. Em Outubro de 1975 foi criada a Secretaria de Estado dos Retornados, integrada no Ministério dos Assuntos Sociais, a qual passou a tutelar o IARN.
O IARN teve que montar estruturas e serviços para responder às solicitações. Recebia os regressados, prestava-lhes assistência jurídica, fornecia alojamentos (em hotéis, pensões e outros edifícios públicos e privados), subsídios de família, bolsas de estudo, e outros apoios.
Os cais de Alcântara e da Rocha do Conde de Óbidos em Lisboa passaram por cenários dantescos, com o amontoar de contentores vindos de África, contendo os haveres que os seus proprietários conseguiam trazer. O decreto que criou o IARN previa o estabelecimento de uma colaboração entre este organismo, “o Ministério dos Negócios Estrangeiros ou outras entidades, na celebração de acordos com as autoridades dos territórios ou países estrangeiros, no sentido de serem obtidas ou garantidas indemnizações pelos bens deixados nesses países, por direitos emergentes de contratos de trabalho ou por quaisquer outros motivos”.
Frequente noutros processos de descolonização, como o francês, a questão das indemnizações não teve sequência em Portugal. Como reação, constituíram-se as “associações de espoliados” de Angola (Aeang) e Moçambique (Aemo).
Esta não foi, no entanto, a única expressão e motivo de descontentamento.
Insatisfeitos com os critérios e formas de integração sugeridos, os retornados, inicialmente organizados em torno da Associação de Portugueses Refugiados do Ultramar (APRU) e de algumas cooperativas e comissões, levaram a cabo uma série de ações reivindicativas. Destas destacam-se, ainda em 1975, a manifestação promovida junto ao Palácio de Belém (Agosto), a ocupação do Banco de Angola e o assalto e destruição da Casa de Angola (Outubro).
No verão de 1975, com o recrudescimento da guerra civil em Angola, intensifica-se o retorno de nacionais vindos deste território. São cerca de 700 os retornados que chegam diariamente a Portugal, através da ponte aérea estabelecida com Luanda e Nova Lisboa (atual Huambo). Vários países europeus e os Estados Unidos da América auxiliaram Portugal na organização desta ponte aérea.
Segundo o relatório da Secretaria de Estado da Administração Local, entre junho de 1975 e novembro de 1976 vieram de Angola 275.600 pessoas, em 905 voos de Luanda e de Nova Lisboa e por meios próprios. De Moçambique chegaram 30.194 e de Timor 1.525. No continente e ilhas o IARN registou 505.087 pessoas, que representavam, nessa altura, 5,3% da população do continente e 5,1% da população das ilhas dos Açores e Madeira.
Aniceto Afonso
Carlos Matos Gomes
Maria Inácia Rezola