Uma das lutas políticas mais importantes para a definição do tipo de regime e pelo poder em Portugal após o 25 de abril travou-se entre o Partido Socialista e o Partido Comunista Português a propósito da lei da unicidade sindical. O Partido Socialista, na altura liderado por Mário Soares e Salgado Zenha, opôs-se à tentativa do PCP de implantar em Portugal a unicidade sindical em oposição à unidade sindical, em que diferentes centrais sindicais se unem para lutarem por um objetivo comum.

A unicidade defendida pelo PCP impunha que os sindicatos existentes se unissem numa frente unitária que seria liderada pela CGTP, formada imediatamente após a Revolução de Abril de 1974, a partir da Intersindical e que dominava o mundo sindical.

A luta política e doutrinária à volta da “unidade sindical” versus “unicidade sindical” constituiu um dos momentos históricos mais agudos do combate político travado durante o PREC.

Um exemplo disso foram as comemorações do 1º de maio de 1975. Ao contrário do que ocorrera um ano antes, em que a harmonia fora dominante, permitindo consagrar o triunfo dos Capitães de Abril, as celebrações de 1975 decorrem sob o signo da discórdia. Os incidentes tiveram como palco a cidade de Lisboa, deixando patente o fosso que se cavara entre o PCP e PS. O sonho unitário, imortalizado um ano antes, com o abraço de Soares e Cunhal, desfazia-se definitivamente.

É difícil apurar com precisão a sequência de acontecimentos ou as causas imediatas que levaram ao confronto físico e verbal nas celebrações do 1.º de Maio de 1975. As denúncias e acusações formalizaram-se numa verdadeira “guerra de comunicados”. Dizendo-se ostracizado desde os primeiros encontros preparatório do evento, o PS denunciou a violência exercida sobre os seus filiados que se viram obrigados a abandonar o Estádio 1.º de Maio no meio de apupos, vaias e sem ter tido acesso à tribuna onde deveriam ter feito uso da palavra. Interpretando estes incidentes como fazendo parte de uma campanha mais vasta tendo em vista a minimização da sua vitória eleitoral, o PS regressou novamente às ruas de Lisboa, no dia 2, promovendo uma gigantesca manifestação de protesto.

Diversa foi a versão dos acontecimentos apresentada pela Intersindical, MES, PCP, MDP/CDE e FSP, segundo a qual, mais que vítima, o PS devia ser considerado o fomentador dos incidentes. Na sua perspetiva o objetivo do PS era promover ações de desacato para descredibilizar as comemorações e as organizações nelas envolvidas.

Desde o início do ano, os problemas sindicais tenderam a sobrepor-se aos restantes. As discussões e polémicas em torno desta questão radicalizaram-se à medida que se aproximava a tomada de posição do MFA. Este começou por apoiar a unicidade sindical. No início desta disputa eram poucos, do ponto de vista sindical e político, os que expressavam opinião contrária. Apenas o PS era decididamente contra, acompanhado por pequenas formações partidárias da extrema-esquerda maoista. Eles insurgiam-se contra a possibilidade de a unidade/unicidade vir a ser imposta por lei.

No auge da questão, a Comissão Coordenadora do Programa do MFA, em comunicado lido na televisão pelo capitão Vasco Lourenço, a 13 de janeiro de 1975, tomou posição “em torno da lei sindical” e pronunciou-se “por unanimidade, pelo princípio da unicidade sindical”.

Por seu turno o PS, não estando disposto a ceder, marcou um comício para o dia 16 de janeiro, a favor da liberdade sindical. O PS investiu toda a sua força política e capacidade mobilizadora na rejeição do projeto de lei”, organizando comícios e multiplicando declarações em que prognosticava “trágicas consequências” para o caso da aprovação da lei sindical.

A publicação da lei ficaria ainda retida por várias razões, nomeadamente a ocorrência do 11 de março, acabando por ser o Conselho da Revolução, na véspera do 1.º de Maio de 1975, a decretá-la na sua redação definitiva.

Aniceto Afonso
Carlos Matos Gomes
Maria Inácia Rezola

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